segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

Bastar-se a si

Uma crônica de LLpoetiza

Síntese:
O júbilo da gente, pessoas simples, acontece com a despretensão do ser; o prazer se esconde por aí, pelo viver-se assim como se é, incumbido pela tarefa de dar bons alimentos a alma através do processo do conhecer-se a si.
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Dentre a fumaça dos carros, a poeira das vadias ruas e tantos altos edifícios, Edmundo, com suas esguias pernas compridas, camufladas por seu ordinário jeans azul desbotado, jornadeava. O menino andava altivo em seus pensamentos, erguido em sua postura, com seus olhos perdidos e distantes pela realidade embaçada. Em que Edmundo pensava era uma incógnita constante em ser até mesmo para si.
Enquanto se movia pelos espaços paralelos e paradoxais era atingido por mísseis e balas de fusis disparados por lentes  observadoras que não se ocupavam de olhar para seus umbigos, enquanto o Sr. do destino, o tempo, passava e os saboreava e mastigava em vida.
Por vezes, o hermético garoto grego  retirava de sua pesada mochila um grande escudo para fazer sua defesa instantânea daqueles ataques dos insdiscretos olhares. Retirava ele uma capa da invisibilidade-como a da Hermione do Harry Potter-; só queria percorrer seu trajeto sem grandes observações sobre sua pessoa. Talvez, caminhasse querendo ser o que já era, o que já havia descoberto ser, um nada. Sim, ele descobriu a felicidade em ser um nada. Contudo, isso era o total oposto do ser um bosta ou ninguém.
O nada e o ninguém... nada representa a simplicidade, clareza, despretensão, naturalidade, enquanto que o ninguém representa a inércia, comodidade, ignorância, falta de afetamento com mundo. Ele, com certeza, andava com suas roupas pelo avesso. Mas sem querer, sem nenhuma pretensão, era representação do desavesso. Sua camisa era preta, a cor da razão.
Andava por aí, entre o vai e vem das pessoas, quando esbarrou com um conhecido seu e de seus pais. Para seu maior desconforto e colossal tragédia, este o encurralou com desafortunadas perguntas, que tinham a forma das de novelistas bisbilhoteiros:
  - Ei, cara! Eai? Anda fazendo o que da vida? Em que tu é bom, rapaz? Gosta de fazer o que? Trabalha em que? Estuda o que? Sabe sobre isso ou aquilo?
Conversando com desconhecidos que não lhe eram incomuns, observava a sede e o deserto em seus olhos ilhados. Esse tipo de gente sempre o leva para um corredor e o encurrala entre seu personagem e o muro; querem que veja o que querem mostrar-lhe e dele procuram tirar algo.
Esses fulanos, do bolso retiram a indagação, uma arma cruel e a apontam em nossa direção, sem reação, pensar é a reação instantânea; calcular a direção, como a palavra SAÍDA(EXIT) iluminada de uma sala de cinema. Ver se torna inevitável, é preciso avistar, mirar e encarar a interrogação flutuante em cima daquela cabeça pensante a vista. Acima da nossa paira uma exclamação após um PLUFT! Que devagar, após devagar pelos pensamentos vorazes a cerca de todo acontecimento, depois de dar aquela leve e perspicaz respirada, sinônimo de "acalmamente", se transforma em pontos finais e vírgulas pontuais.
Em contrapartida, dentro dele, Edmundo, escrevia fazendo uso de reticências durante todo diálogo esquadrinhador e espiolhento. O crítico lhe causava o mesmo arrepio de uma criança piolhenta. E ele continuava sendo nada. Pode ter sido várias coisas naquele dado momento de gerar pensamentos, no decorrer do "Quis". Até porque nos utilizamos de aquarela e pintamos uma tela no decorrer dos momentos, mas não passa de um reflexo estonteante de quem éramos naquele pequeno período de tempo; eramos sombras em cavernas. A imagem foi construída por cima de um momento psíquico estabelecido, a datar, pelas últimas notícias, últimas experiências, produto de escolhas de um curto flash de existência.
Ele foi tudo o que podia-se imaginar fundamentando-se nos elementos expostos naqueles átomos de tempo. Enquanto isso, não era nada. Porque a nada nos resumimos. O homem se reduz a pó e ao pó retorna. Ele pode ser tudo enquanto nada é.
Naquele tempo, Edmundo, foi tudo e nada; representação do céu e do inferno em um imaginário totalmente alheio ao seu, enquanto esta outra mente lhe fazia severas críticas e vorazes julgamentos que nem sempre ficavam sob as sete chaves do silêncio da mente. Os julgamentos sempre escapam pelo cano de descarga, sempre estão nos olhos, nos pesos das palavras, nas atitudes que mentem dizendo não querer dizer nada.
O jovem rapaz terminou o papo e se foi insatisfeito, verificando o que lhe havia restado nos bolsos após assalto. Bobo percebeu que mais forte se sentia, porque tudo em si cabia e um jeito tinha dado naquela situação esquadrinhadora e espiolhenta; percebia que bastar-se a si mesmo era o que lhe cabia. Deixou para trás as sombras de uma realidade de julgamentos e preocupações de agradar um bando de gente vazia. O terror não mais o podia acometer e o vazio não preenchia seu ser. Ele era Edmundo, o único do mundo, um hermético menino que deu a luz a um novo universo de eventos onde importava e afetava, em primeira mão, a si, seu ser. Sabia do seu singular posicionamento no tempo-espaco e não era consumido e cegado pela ambição de ser alguém que lhe era estranho, alheio.
O espelho a sua frente refletia a sua a sua face quando despertou para essa nova realidade. Edmundo, o único do mundo.

LLpoetiza

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